MHealth para promover o cuidado híbrido em idosos crônicos

Atualmente existem por volta de 1200 operadoras de plano de saúde ativas no Brasil que possuem milhões de beneficiários sendo que em torno de 15% são idosos (acima de 65 anos de ambos os sexos) (ANS, 2019). Desses idosos, 72% possuem  doenças crônicas não transmissíveis (DCNT). São aquelas de progressão lenta e de longa duração, que muitas vezes levamos por toda a vida. Podem ser silenciosas ou sintomáticas, comprometendo a qualidade de vida. Nos dois casos, representam risco para o paciente.

A maioria dessas doenças está relacionada ao avanço da idade e ao estilo de vida – hábitos alimentares, sedentarismo, estresse entre outros aspectos. Entre as principais ocorrências no Brasil estão: diabetes, hipertensão e cardiopatia (Biosom, 2017). Os custos com os tratamentos desses idosos têm aumentado anualmente, dificultando a gestão financeira dos planos de saúde, e podendo, em poucas décadas levar a um colapso financeiro dessas empresas. Um caminho para evitar este quadro negativo é a realização de atividades preventivas de forma escalável e com baixo custo, principalmente junto ao público de idosos que responde por volta de 15% da população desses planos, mas é responsável por mais de 50% dos valores gastos anualmente. Isto é, se dobrar o número de idosos dentro do plano, o mesmo pode não conseguir se viabilizar economicamente.

Para tornar a medicina preventiva financeiramente viável, a tecnologia tem sido uma aliada neste processo. Uma das principais abordagens é o emprego de mHealth. Trata-se do uso de tecnologias móveis e sem fio, como telefones celulares, dispositivos mobile de monitoramento de pacientes, assistentes pessoais digitais e aplicativos de softwares móveis (APPs), para apoiar a realização dos objetivos da área de saúde. Um exemplo do seu uso esta associado a biotelemetria para coleta de dados por longo tempo com o intuito de ajudar a desenvolver estratégias de minimização dos efeitos de uma fadiga oncológica, gerando sequências de procedimentos fisioterapêuticos, um possível aconselhamento psicológico, ou mesmo, viabilizando intervenções de origem farmacológico e não farmacológico entre outras atividades.

mHealth é um excelente meio para viabilizar uma proposta de valor que tem sido estudada nos últimos anos para a prevenção e acompanhamento de idosos com condição crônica (FAPESP, 2018). Essa proposta envolve o CUIDADO HÍBRIDO OU COMBINADO (do inglês blended healthcare ou blended care). Trata-se da junção de atividades envolvendo o atendimento presencial e o cuidado digital com o objetivo de prover um acompanhamento do desempenho do paciente no seu autocuidado (Valerio Netto & Tateyama, 2018). Atua como extensão do atendimento físico. São complementares um ao outro, não importando a proporção do uso de cada um, no processo de cuidado do individuo assistido.

A inspiração veio do Fisital. Darryl Rigby, professor de Harvard, se referiu ao aprendizado das empresas que precisaram ter seus modelos de relacionamento com o cliente e com o mercado contemplando os dois ambientes: offline e online. O cuidado híbrido funciona como uma ponte entre a prestação tradicional de assistência presencial e as soluções de Saúde Digital (eHealth). O seu processo de atuação pode ser observado na figura abaixo.

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Por exemplo, de posse de um smartphone conectado na Internet, os pacientes poderão, além de transmitir as medidas fisiológicas, analisar essas atividades no tempo (data e horário), com o objetivo de identificar determinados tipos de padrões de comportamento. Para o módulo de análise dos dados capturados podem ser empregados os algoritmos analíticos (Health Data Science) para identificar esses padrões, e posteriormente, construir uma base histórica de dados fisiológicos/comportamentos e alertas recorrentes.

Referente aos benefícios de forma geral, as plataformas baseadas em cuidado híbrido irão prover um grau de assimilação elevado do conhecimento do perfil do histórico de medidas fisiológicas e de atividades do paciente (comportamento), pois é um sistema que pode promover um estudo analítico dos hábitos e rotinas (toma o remédio adequadamente, faz caminhada, etc.), podendo, inclusive estimular novas rotinas para o usuário monitorado. Com isso, visa oferecer aos profissionais de saúde uma formatação de dados mais adequada (evidências), possibilitando, assim, que os mesmos possam desempenhar suas funções de forma mais segura e eficaz junto ao paciente.

Terapias digitais para promover o tratamento de pacientes

Terapêutica Digital, do inglês Digital Therapeutics (DTx), fornece intervenções terapêuticas baseadas em evidências para pacientes que são orientados por programas de software para prevenir, gerenciar ou tratar um distúrbio ou doença médica. Eles são usados independentemente ou em conjunto com medicamentos, dispositivos ou outras terapias para otimizar o atendimento ao paciente e os resultados de saúde. Os DTx incorporam as melhores práticas de tecnologia relacionadas a design, validação clínica, usabilidade e segurança de dados. Eles são validados pelos órgãos reguladores, como FDA (Food and Drug Administration) nos EUA, para balizar as questões relacionadas ao risco, eficácia e uso pretendido. No Brasil, o termo se popularizou como terapia digital.

Atualmente, na base de publicações PubMed, especializada na área de saúde, já existem 28 artigos relacionados com o termo “Digital Therapeutics“. A grande maioria publicada a partir de 2018. Em Sverdolov et al. o termo é descrito como sendo relacionado a um produto baseado em tecnologia que tenha passado por validação clínica tais como sistemas digitais, aplicativos entre outros e que tenham impacto direto no diagnóstico, prevenção, monitoramento ou tratamento de doenças ou síndromes. Para a consultoria Deloitte, eles são semelhantes aos populares aplicativos de bem-estar, mas com uma diferença fundamental: CONCENTRAM-SE NO FORNECIMENTO DE RESULTADOS CLÍNICOS. São tratamentos comportamentais baseados em evidências entregues online que podem aumentar a acessibilidade e a eficácia dos cuidados de saúde. A característica chave de terapia digital é a otimização de um tratamento.

Condições para ser considerado um DTx envolvem autorização por um órgão regulador como o FDA ou CE (Certificado Europeu), lembrando que no Brasil a ANVISA ainda não possui uma regulamentação para estes casos. Deve ser clinicamente validado e seu procedimento ser remunerado. Deve existir a coleta de dados e o loop de feedback instantâneo. Deve ser conectado ao fluxo de trabalho clínico e a prescrição deve ser realizada por um profissional de saúde que irá recomendar ou prescrever um DTx.

Seu potencial de uso está em oferecer aos pacientes, prestadores e operadoras novas opções de terapia para necessidades médicas não atendidas. Ser utilizado independentemente ou em conjunto com outras terapias. Aprimorar e apoiar os tratamentos médicos atuais. Permitir a redução da dependência de certos produtos farmacêuticos. Promover a integração das diretrizes médicas e às melhores práticas para entregar uma experiência do paciente com melhores resultados.

Em setembro de 2017, o reSET da empresa PEAR Therapeutics, que atualmente é comercializada pela SANDOZ (novartis company), se tornou a primeira terapia digital aprovada pelo FDA. Ela trata pessoas com transtorno de uso de opióides e com transtorno de uso de substâncias. É importante comentar que uma terapia digital pode ser prescrita com ou sem combinações com uma farmacoterapia. É importante NÃO CONFUNDIR a terapia digital com serviços de teleconsulta ou teleatendimento, muito comum nos portfólios de startups como a TalkspaceDoctor on DemandTeen Counseling, etc. O sucesso de uma terapia digital requer três fases (Valerio Netto, 2020): 

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Para Matthew Bonam, diretor da Astrazeneca, administrar terapias de maneira tradicional não atenderá aos requisitos de futuros cuidados de saúde e não maximizará o acesso aos tratamentos. Ele comenta que as empresas farmacêuticas e seus parceiros de tecnologia estão dedicando investimentos significativos ao desenvolvimento de soluções para pacientes “além da pílula“. Muito desse esforço está na integração de medicamentos com dispositivos e tecnologia digital para maximizar a eficácia das terapias dos pacientes e atender às necessidades dos futuros sistemas de saúde.

Para Bonam, o mercado já se transformou e é questão de tempo a popularização das terapias digitais. Essa também é a opinião de Eugene BorukhovichGlobal Head of Digital Innovation da Bayer e de Megan Coder, diretora executiva da Digital Therapeutics Alliance. Desde 2018, vêm ocorrendo diversos eventos sobre o tema como o Health 2.0 BarcelonaYale Digital Medicine SymposiumAWS Healthcare & Life Science SymposiumDigital Health Summit do CES (Consumer Electronics Show), entre outros. Agora é pagar para ver!